O EXÍLIO
POLÍTICO

    1969. Longa noite. O autoritarismo e a repressão instaurados pelo governo militar recrudescem na mesma proporção em que a oposição se radicaliza. A ditadura militar, através do Presidente Marechal Arthur Costa e Silva impinge o Ato Institucional número 5 em 13 de dezembro de 1968 e atinge o ápice da imposição à força. Os mecanismos adotados pelos militares visavam legalizar ações políticas não previstas e mesmo contrárias à constituição e vinham aniquilando qualquer possibilidade de oposição democrática constitucional ao regime. Os demais Atos Institucionais levam à cassação de políticos, à ilegalidade de organizações partidárias e ao fechamento do congresso. O governo cria o SNI (Sistema Nacional de Informações) subdividindo-os em grupos policiais e paramilitares com o intento de garantir a "segurança nacional" contra a ameaça dos grupos guerrilheiros opositores. Visando o desmantelamento desses grupos, tais instituições governamentais instauram a desumana rotina de torturas e assassinatos. Os meios de comunicação são controlados e sofrem censura direta do governo. A nação brasileira, em sua maioria desconhece o sangue que corre nos porões da ditadura.

    1969, ano em que, segundo Herbert Daniel, poderia ter sido uma sugestiva metáfora de tantas esperanças e possibilidades democráticas de partilha, de estimular encaixes, organizar contatos, diálogos...

    A oposição arma-se e torna-se "esquerda armada", com a formação dos diversos grupos de guerrilhas, quixotescamente formados por algumas centenas de estudantes de uma geração politizada e políticos indignados com seus direitos cassados. Inspirados na experiência das revoluções cubana e chinesa, os textos marxistas, o livro "Revolução na revolução?" de Regis Debray e textos de Althusser, em sua totalidade são jovens com idade inferior a trinta anos e não tinham experiência militar alguma para o combate ao poderio das forças armadas.

    Herbert Daniel opta em participar de sua primeira "ação armada" no final de janeiro de 1969, aderindo ao grupo revolucionário COLINA, Comando de Libertação Nacional, promovendo um assalto a banco para a subsistência e os recursos necessários à continuidade do grupo. Essas "ações armadas" e "desapropriações" são também as únicas oportunidades com que esses grupos imaginam poder alertar e conscientizar a sociedade sobre um regime fascista e sobre as torturas a que são submetidos os cidadãos que ousam discordar do sistema. Por vezes, quando a ação política é reivindicada, procura-se explicar a função daquela perturbação.

    Quando os grupos paramilitares conseguiam prender algum membro dessas organizações, os demais militantes corriam risco de vida, assim, desmobilizavam estruturas táticas montadas, devido às sistemáticas torturas impostas para delação dos demais membros.

    O exílio político de Herbert Daniel começa quando ele cai na clandestinidade, alguns dias após sua primeira participação na luta armada. Pela fragilidade tática e estrutural desses grupos, a repressão governamental desmantelava as organizações com facilidade. Ângelo Pezzuti da Silva, amigo de faculdade e militante, foi preso e torturado. Outros foram mortos. Herbert Daniel se viu obrigado a abandonar o convívio familiar e seus estudos na faculdade de medicina, seguindo para o Rio de Janeiro, enquanto seu rosto figurava nos cartazes de "terroristas procurados" em todo o país.

    Uma das ações de desapropriações mais espetaculares de que Herbert Daniel participa foi quando o seu então grupo, Vanguarda Armada Revolucionária, rouba o cofre que estava na residência do "Dr.Rui", codinome da amante do governador Adhemar de Barros. A singela quantia de dois milhões e meio de dólares era parte (minúscula) da "caixinha" do governador que "roubava, mas fazia".

    Parte para o Vale do Ribeira, área escolhida pelo grupo Vanguarda Popular Revolucionária para treinamento militar e preparação de guerrilheiros. Se agrega ao grupo comandado pelo Capitão Carlos Lamarca, um dos comandantes de organização mais procurados pela repressão por ter desertado do exército "desapropriando" algumas dezenas de fuzis. O Exército localiza a área com um formidável aparato de guerra. Escapa pela retaguarda, regressando ao Rio de Janeiro.

    No momento em que diversos guerrilheiros se encontram nas garras da ditadura sob violentas torturas, os remanescentes ainda em liberdade vislumbram a decisão de promoverem o sequestro de diplomatas de países com poder político para exigirem a troca pela libertação dos presos políticos.

    Ativistas banidos em troca do embaixador alemão

    Alguns meses após a primeira experiência bem sucedida do sequestro do embaixador americano Charles Burke Elbrick, elaborada pelo grupo MR-8 junto com Aliança Libertadora Nacional, comandada por Carlos Marighela, Herbert Daniel participou do sequestro do embaixador alemão Ehrenfried von Holleben. O sequestro é elaborado pela Vanguarda Polular Revolucionária (segunda formação). O embaixador é libertado em 15 de junho de 1970, após ser trocado por quarenta presos políticos. Dentre os libertados, o seu amigo Ângelo Pezzuti da Silva e Fernando Gabeira, que participou do sequestro do embaixador americano. Quando o jornal publica a foto dos militantes banidos, Herbert Daniel comentou que seria um dos momentos mais felizes de sua vida. Atualmente, alguns desses militantes libertados integram a direção do PV - Partido Verde.

    Herbert Daniel participou ativamente de dois sequestro de diplomatas. Em dezembro de 1970, durante o sequestro do embaixador suíço Giovanni Buscher, comemora secretamente seus vinte e quatro anos no "aparelho" onde passou quarenta dias até que se consumasse a troca do embaixador pela libertação de setenta presos políticos.

    Em novembro de 1971, conhece Cláudio Mesquita, um "aliado" que ficou responsável a dar fachada à casa que acoitava há meses "um dos guerrilheiros mais procurados e jurado de morte pelo DOI-CODI". Herbert Daniel fica nove meses trancado em uma casa com determinação de não acender as luzes nem emitir ruídos que despertassem à vizinhança a presença de um morador. Por dar guarida a um "terrorista" tão procurado, Cláudio começa a ser perseguido e daí em diante, começam as fugas com o amigo, com quem conviveu durante 20 anos, até a morte de Herbert Daniel. A irmã, a mulher e a mãe de Cláudio foram torturadas no intento de informarem o paradeiro dos dois.

    Herbert Daniel milita até 1972, momento em que a grande maioria dos ativistas militantes tinham sido mortos, presos ou exilados em outros países. O momento político não propiciava mais a "dinâmica da sobrevivência", em que os poucos quadros remanescentes não mais refletem sobre os impasses e desafios daquele determinado momento político sem saída, cuja única finalidade era persistir, sobreviver. Segue-se então o período em que Herbert Daniel define como "a época de imobilidade e confusão, um exílio sem nome que se passava nos campos de um planeta desconhecido e triste."

    Durante todo o ano de 73 e até setembro de 74, inventam um degredo a dois, sem nenhum contato com os companheiros presos ou banidos. Vivem com identidades falsas e sobrevivem de trabalhos esporádicos. Cláudio chega a fazer comercial para televisão.

    Herbert Daniel e Cláudio Mesquita saem do Brasil pela fronteira argentina em 7 de setembro de 1974, rumo à Europa. Aqui começa o exílio pátrio de Herbert Daniel...


Trecho da música "Alegria, alegria" (Caetano Veloso) - Caetano Veloso:

Trecho da música "Alegria, alegria" (Caetano Veloso) - Caetano Veloso


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